O Namibe, a Avó Rosa e à Minha Rainha do Bailundo”

Ela entrou como uma tempestade de areia fina do deserto do Namibe, sem pedir licença, sem aviso, sem clemência e aquela nossa amiga nos apresentou. A porta da casa da Avó Rosa rangera, como sempre rangera, mas naquele dia trouxera consigo não a brisa quente do litoral, mas um grande furacão com mil emoções armadas até os dentes.

Eu, “um miúdo de Luanda, pingo de gente da cidade grande”, me vi acuado. Recuei. “Fuzilaram-me com os olhos encantos mais belos”, digo agora, mas na hora só senti o meu corpo trair a minha mente: as pernas pesadas, as mãos suando, a voz engasgada num “xé pah…” que nunca terminava…

O Mentiroso e a Alma Tagarela

O lado artista de quimbundo entra em ação: eu digo pra mim mesmo “Hum, ela nem é tão bonita assim”, mentia ao meu muxima, e quanto mais sabolava na minha mente (mentia a mim mesmo, fingia para mim mesmo) enquanto o coração batia um Kuduro pesado no peito. Mas a alma, essa me traía sempre, sussurrava em uníssono com o meu sangue: “Chama ela!!! Nós precisamos dela!!!”

A minha biologia masculina deseja-lhe muito e nos meus sonhos sem quer, mas querendo brincava de casamento antes mesmo do primeiro “olá”. Eu o menino da cidade grande (o kandenge viju) reduzido a um farrapo de nervos diante da “miúda bonita” do Namibe! A Rainha do Bailundo que, diga-se de passagem, não usava saltos altos nem vestidos de festa. Usava a coragem nos olhos e o vento do sul nos pés, cheia de ginga e doçura, a pele castanha queimada pelo ardente do deserto do meu Namibe.

O Filme Que Só Eu Podia Dirigir

“O artista deste filme sou eu e não vou morrer assim”, pensei, tentando me convencer de que ainda tinha o controle. HUM… Mentira de poeta… Ela já tinha escrito o roteiro inteiro no momento em que entrou pela porta da casa da Avó Rosa.

E que roteiro era este?

  • Cena 1: Eu, fingindo desinteresse, mas roubando olhares enquanto ela conversava com a nossa amiga na casa da Avó Rosa.
  • Cena 2: Ela, rindo de algo que eu nem ouvi, mas eu cassimbulando aquela voz, aquele sorriso… para eu sonhar nos dias dificies de sofrimento, lembrar e imaginar o sabor da sopa da Avô Rosa.
  • Cena 3: O meu “playboy” de Luanda sendo derrotado por uma garina de chinelo (a minha Rainha do Bailundo, que sem falar disparou tiros de beleza e foi o suficiente. Ganhou-me!

O Desfecho (Que Ainda Está Sendo Escrito)

Anos depois, descubro: o amor não é um filme de herói. É um documentário mal gravado, cheio de cortes brutos e cenas que ninguém entende, até que, de repente, tudo começa a fazer sentido.

Ela, a “minha Rainha do Bailundo”, não veio para ser minha musa. Veio para me lembrar que eu também sou humano. Que Luanda não me preparou para os ataques de beleza vindos do sul. Que a Avó Rosa, sábia mamã, já sabia tudo e me deixará uma herança “sementes de felicidade” quando me vi engolir seco e gaguejar, tremi… “o meu muxima gritou ela já te viuuuuu…” e eu disse: “ya ela me viuuu…

E hoje? Hoje eu me rendo. “Minha bela”, eu chamei. E ela veio. E o vento do Namibe nunca mais parou de soprar na minha vida.


Este artigo é um tributo àquele momento em que o amor nos pega desprevenidos e à coragem de admitir que fomos derrotados pela beleza.

massambalamedia@gmail.com
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